Não
sei se era você que dançava ou se a dança caminhava no seu corpo. Havia ali uma
mistura inédita: um pouco de Bahia, um pouco de África, um pouco de Espanha e um
toque contemporâneo, requintado pelos anos de leitura corporal. Tinha
consciência do vento, e por isso mesmo bailava. Meio cigana, sandálias de
couro, ouvia-se o arrastar dos seus passos. Houve até quem disse em tom de
fatalidade: - desceu Iansã; agora só Ogum para acalmar. Um devoto preferiu
lhe chamar de Yemanjá. Antecipava-se na mente dele o 02 de fevereiro.
Um
vestido estampado lhe cobria o corpo, e, quanto mais se remexia, suas lindas
costas morenas ficavam desenhadas. Fazia amor consigo mesma. E na pista
dançante já nascia sua criança, que, logo após o parto, ali mesmo, se balançava nos seus braços receptivos. Nascia o seu
especial movimento. Era este o seu terceiro filho.
A música era um detalhe, porque, na casa, a
precisão irregular da sua dança prendia todas as coisas que adornavam o
ambiente - árvores, artes rupestres, mesas, cadeiras, garçons, e inclusive
todos os convidados, quase umbilicalmente ligados a você, dominados pela
liberdade que transpirava em seu corpo. Vaporizados pela sensualidade que
escorria do seu suor, gota por gota, tocando-os a cada giro estonteante que o
samba lhe impulsionava. Bela e morena. Morena, e só por isso bela, era você ditando
doces ordens a quem por ser compreender artista se achava livre. Viam-se homens
transtornados. Viam-se homens transformados em bobos da corte, menestréis
mudos, aturdidos diante da beleza aniversariante. Esqueceram até da data
festiva. As palmas foram direcionadas a você por outro motivo, apartadas dos
seus enigmáticos 30 anos. No fim da festa, com o bolo cortado, comemorou-se seu
aniversário, mas o que marcou todos foi o seu inesperado espetáculo dançante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário