O sol é maravilhoso. Não
se apaga quando a noite chega e não se intimida quando encontra becos escuros. Trata-se
de verdade que dispensa consensos.
Por isso, está tudo tão
claro, mesmo à noite, quando a lua nos banha com sua pouca luz, que apesar de
não ser totalmente sua, é suficiente para que a visão descanse em leve penumbra
e sinta a existência.
Mas, o que é que há com o
homem, meu Deus?
E nesse embalo meditativo,
conduzido pelos olhos fechados de tanto pensar, sente-se que os sonhos, pesados
do fardo diário, parecem inaptos a cumprir sua função - liberar a mente para
relativo espaço poroso, sutil, de reencontro, em que seja gostoso estar e
pensar que o mundo existe, que a vida é real -, e isso já contempla o
extraordinário, o espiritual. Registre-se em cartório, por favor.
Seria como sentar-se à
mesa com o seu tom pensante, deslocado de ti para você, ou no sofá da
existência, compartilhado por tantos ginastas da angústia humana, e, de pernas
cruzadas, após uma baforada refrescante, dada pelas trombetas da lucidez, sentir,
apenas sentir, sem pensar, se é que isso é possível, numa espécie de eco da
emoção, o Eu existo. Isso é luz. Isso é mistério.
A luz do sol é
intensa. Já é um bom ponto de partida. A
procura pela luz também é intensa. Já é outro excelente ponto de partida, com
vocação para ser chegada, fim, mas que se perde no caminho porque no meio deste
há o fato humano, a existência da carne pensante e emotiva, que na sua
individualidade atormenta-se para encarar a luz, embora, inconscientemente,
seja pelo suor, seja pelo prazer, absorva diariamente essa luz, que tanto almeja,
que tanto existe, que tanto rejeita.
Complicadíssimo de se
descrever. Complicadíssimo de se entender. No entanto, possível compreender - porque compartilhamos
aquele sofá da existência - esse impasse sofredor, essa luta, residente em nós,
entre a luz e o mistério. Observe: entre
a luz e o mistério, não é entre Deus e o Diabo; não é entre o Bem e o Mal -
para esse debate específico, recomenda-se, apesar de não completamente lido,
Nietzsche.
O homem, portanto, essa
fera sofridamente domesticada, e que dizemos que foi a evolução a sua madrasta
educadora, não esquece sua raiz confusa, e continua querendo desvendar a ideia
do mistério, o segredo lançado ao mar, passado entre as nuvens, que não se sabe
quem ou o que o enviou, e esquece diariamente da luz posta em sua vida, do
caminho apresentado à sua sorte, sendo que, ao lembrar-se dessa luz, ao exemplo
do que acontece quando admira o sol, não consegue entendê-la, não consegue
desfrutá-la, visualizá-la por longo tempo. Volta-se, então, cabisbaixo, para o
mistério, e deseja, de qualquer forma, revelá-lo, dizer que ele, mistério, lhe
é familiar, justamente para torná-lo claro, luz, e, adiante, negá-lo por mais
de três vezes, porque mal entende a luz, porque mal entende o mistério.
E,
nesse travamento de emoções, esquece, mais uma vez, que é humano e só isso
basta para sentir-se extraordinário, sobrenatural.
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